A árvore da malária
Onde existe malária, existe a árvore da malária. Fernando reconheceu-a imediatamente, embora não soubesse o seu nome científico, à entrada da cabana da recepção do campo. Depois de dar os seus nomes, no hotel no meio da reserva, abriram a cancela para o carro entrar.
Fernando pensou como seria, se ao voltar a cabeça visse Margarida ao lado dele, em vez de Teresa, a sua mulher. A inteligente e morena Margarida, em vez da sua loura , gorda esposa, que nesse momento lançava gritinhos de alegria e fazia perguntas infantis numa voz aguda e patética.
" A minha mulher deseja saber o tamanho da reserva de Ntsukunyane " perguntou ele ao empregado de fato khaki. "Cerca de quatro milhões de acres ", respondeu o africano. " Acha que veremos leopardos ? "
" Quem sabe ", respondeu ele, " são animais nocturnos, é preciso sorte. Mas verão leões, elefantes, hipopótamos.... Não se esqueçam que têm de estar de volta às seis horas, antes de anoitecer e fecharmos as cancelas ". Eram quase quatro horas, depois de deixarem as malas no quarto ainda teriam tempo de dar uma volta ?
Foram explorar a reserva, " um prémio ao primeiro que vir um animal selvagem " disse Teresa. Com as janelas abertas, estendia o seu braço branco para fora do carro. " Temos de ter as janelas fechadas e não sair do carro...." disse Fernando. " Oh, porquê ? estúpidas regras...." e fez beicinho, como um criança.
Estúpidas regras, que o impediam de apaixonar-se por outra, deixar a sua mulher e partir .... O que vira ele nela, dez anos atrás ? Encantara-se com a sua fragilidade e inocência, os saltos e risinhos que agora o irritavam numa mulher de trinta anos.
Ela ganhou, foi a primeira a ver a zebra, e exigiu o prémio , um beijo, ele deu-lho na face e arrepiou-se....
Mais tarde, no quarto em Thaba, o calor era insuportável. Duas camas, casa de banho, ar condicionado que ligaram, " Ainda bem que tomámos os comprimidos anti malária, aqui deve haver muitos mosquitos. ", disse ele. " Trouxeste o spray anti mosquitos ? " . Teresa estremeceu, imediatamente atemorizada, " Não sei....". " O que queres dizer, não sabes ? estava nessa tua bolsa de maquilhagem. ". Ela abriu a bolsa sabendo muito bem que lá não estava, os mosquitos nunca a picavam e ela esquecera-se de o trazer...". Fernando despejou-lhe a bolsa, irritado "Olha para estas porcarias, cremes hidratantes, cremes solares, base, como se fosses uma jovem modelo, não te passou pela cabeça trazer o spray em vez disto ? ", "Podemos comprar na loja do hotel ", disse ela com os lábios a tremer. Odiava quando gritavam com ela. O pai costumava gritar com a sua mãe, mas com ela não por ser criança, e então mantivera os seus maneirismos de criança na sua juventude... " A esta hora já deve estar fechada ! " disse o marido, batendo com a porta da casa de banho.
A noite caiu rapidamente , como é costume em África. Jantaram com os outros hóspedes na sala. Ela quase não conseguia engolir a carne de caça, seca e demasiado assada. Uma segunda lua de mel, pensara ela. Emagrecera cinco quilos, comprara roupas novas, esperara que ele esquecesse a outra mulher e voltasse para ela, como lhe prometera. Mas ela parecia estar entre eles, no olhar crítico dele, no ar ausente com que lhe falava.
Voltaram para o quarto, deitaram-se e ele adormeceu quase imediatamente na sua cama. Ela ficou acordada até às quatro da manhã. Devia estar a amanhecer, o barulho do ar condicionado não a deixava dormir.
Levantou-se, desligou o ar condicionado e abriu a janela. Finalmente, pôde dormir.
Na manhã seguinte , ele quase não podia abrir os olhos, tão inchada estava a sua cara. Havia mosquitos em todas as paredes, como teias. Teresa olhou-o e riu-se nervosamente.
Os carros começaram a sair do campo, mas Fernando não podia conduzir e ela nunca conseguira passar no exame de condução, em vez disso foram tomar o pequeno almoço.
Quando a loja abriu, Fernando comprou duas embalagens de repelente de insectos diferentes.
Cerca das dez horas a cara dele melhorara um pouco, e com uns óculos escuros, seguiram no carro pela Picada dos Hipopótamos. Fernando contara as picadas de mosquitos e eram vinte e quatro. esperava que os dois comprimidos de quinino fossem suficientes para o proteger....
Pararam junto do rio Suthu, a observarem as águas azuis e calmas, onde nada se movia, excepto um tronco. O tronco desapareceu, provando ser um crocodilo. O dia estava muito quente e húmido, e ele sentia uma espécie de febre, pensou " porque voltara ele para ela ? estava louco ? " .
Com uma calças cor de rosa e blusa branca, demasiado justas, ela observava a planície, através dos binóculos. Exclamou excitada que vira uma família de macacos e começou a abrir a porta do carro. Fernando encolheu os ombros, em duas horas de viagem pela reserva, não tinham visto um único leão ou elefante " Se aparecer um guarda tu é que falas com ele ! " gritou-lhe. Ela riu-se e afastou-se um pouco do carro. Começou a chamar os macacos, que fugiam dela. Ele com a máquina fotográfica, procurou animais para fotografar. Entre as ervas, que chegavam acima dos joelhos , viu de súbito duas chitas, deitadas ao sol da tarde. saciadas, satisfeitas, mas de olhos abertos. a menos de ...cem metros ? Pensou naquele documentário que vira, sobre a velocidade que as chitas atingiam em corrida. Devia chamar Teresa. Mas não chamou. Pensou em como Margarida gostava de gatos, como gostaria de estar ali. Teresa entrou no carro. Ele não lhe disse nada sobre as chitas que vira.
Cerca das cinco horas, ela quis sair de novo do carro. Dentro de uma hora anoiteceria, tinham de estar de volta ao campo. Surgiu um carro de turistas, com uns sul africanos que tinham estado na mesa a jantar junto deles, no dia anterior . O carro parou e o homem forte e loiro, debruçou-se da janela e gritou " a senhora não devia estar fora do carro ! ". Teresa fez um ar de colegial e respondeu " promete não contar a ninguém ? ". O homem deu um resmungo de impaciência e disse a Fernando " se querem ver leões, nesta estrada de onde vimos estavam alguns ". Arrancaram em direção a Thaba.
"Vamos lá ver ? " disse Teresa ? " Já é tarde, " respondeu Fernando, mas afinal decidiu ir .
Lá estavam eles, uma leoa com as suas crias, sossegada à sombra. Pararam a alguma distancia, e Teresa, claro, quis sair do carro para tirar algumas fotos. Ele encolheu os ombros de novo. Ela afastou-se mais um pouco. A leoa levantou-se e devagar, começou a afastar-se com as suas crias.
Tinham menos de uma hora para voltar para Thaba. Ele pensou o que aconteceria se não chegassem a tempo, deixar-nos-iam na selva, toda a noite ? E se ele simplesmente partisse e a deixasse ali ? Ligou o carro e começou lentamentente a fazer marcha atrás, para dar a volta. Ela parou, olhando para ele, sem falar. Ele engatou a primeira. preparava-se para arrancar quando viu o carro dos guardas, a aproximar-se. " Têm de voltar para o acampamento ! " , " estão a 30 km e falta meia hora para fecharem as portas ! ". disseram eles.
Teresa entrou no carro e olhou pela janela. Engoliu as lágrimas. Não só já não gostava dela , como a queria morta.
(....)
Fernando pensou como seria, se ao voltar a cabeça visse Margarida ao lado dele, em vez de Teresa, a sua mulher. A inteligente e morena Margarida, em vez da sua loura , gorda esposa, que nesse momento lançava gritinhos de alegria e fazia perguntas infantis numa voz aguda e patética.
" A minha mulher deseja saber o tamanho da reserva de Ntsukunyane " perguntou ele ao empregado de fato khaki. "Cerca de quatro milhões de acres ", respondeu o africano. " Acha que veremos leopardos ? "
" Quem sabe ", respondeu ele, " são animais nocturnos, é preciso sorte. Mas verão leões, elefantes, hipopótamos.... Não se esqueçam que têm de estar de volta às seis horas, antes de anoitecer e fecharmos as cancelas ". Eram quase quatro horas, depois de deixarem as malas no quarto ainda teriam tempo de dar uma volta ?
Foram explorar a reserva, " um prémio ao primeiro que vir um animal selvagem " disse Teresa. Com as janelas abertas, estendia o seu braço branco para fora do carro. " Temos de ter as janelas fechadas e não sair do carro...." disse Fernando. " Oh, porquê ? estúpidas regras...." e fez beicinho, como um criança.
Estúpidas regras, que o impediam de apaixonar-se por outra, deixar a sua mulher e partir .... O que vira ele nela, dez anos atrás ? Encantara-se com a sua fragilidade e inocência, os saltos e risinhos que agora o irritavam numa mulher de trinta anos.
Ela ganhou, foi a primeira a ver a zebra, e exigiu o prémio , um beijo, ele deu-lho na face e arrepiou-se....
Mais tarde, no quarto em Thaba, o calor era insuportável. Duas camas, casa de banho, ar condicionado que ligaram, " Ainda bem que tomámos os comprimidos anti malária, aqui deve haver muitos mosquitos. ", disse ele. " Trouxeste o spray anti mosquitos ? " . Teresa estremeceu, imediatamente atemorizada, " Não sei....". " O que queres dizer, não sabes ? estava nessa tua bolsa de maquilhagem. ". Ela abriu a bolsa sabendo muito bem que lá não estava, os mosquitos nunca a picavam e ela esquecera-se de o trazer...". Fernando despejou-lhe a bolsa, irritado "Olha para estas porcarias, cremes hidratantes, cremes solares, base, como se fosses uma jovem modelo, não te passou pela cabeça trazer o spray em vez disto ? ", "Podemos comprar na loja do hotel ", disse ela com os lábios a tremer. Odiava quando gritavam com ela. O pai costumava gritar com a sua mãe, mas com ela não por ser criança, e então mantivera os seus maneirismos de criança na sua juventude... " A esta hora já deve estar fechada ! " disse o marido, batendo com a porta da casa de banho.
A noite caiu rapidamente , como é costume em África. Jantaram com os outros hóspedes na sala. Ela quase não conseguia engolir a carne de caça, seca e demasiado assada. Uma segunda lua de mel, pensara ela. Emagrecera cinco quilos, comprara roupas novas, esperara que ele esquecesse a outra mulher e voltasse para ela, como lhe prometera. Mas ela parecia estar entre eles, no olhar crítico dele, no ar ausente com que lhe falava.
Voltaram para o quarto, deitaram-se e ele adormeceu quase imediatamente na sua cama. Ela ficou acordada até às quatro da manhã. Devia estar a amanhecer, o barulho do ar condicionado não a deixava dormir.
Levantou-se, desligou o ar condicionado e abriu a janela. Finalmente, pôde dormir.
Na manhã seguinte , ele quase não podia abrir os olhos, tão inchada estava a sua cara. Havia mosquitos em todas as paredes, como teias. Teresa olhou-o e riu-se nervosamente.
Os carros começaram a sair do campo, mas Fernando não podia conduzir e ela nunca conseguira passar no exame de condução, em vez disso foram tomar o pequeno almoço.
Quando a loja abriu, Fernando comprou duas embalagens de repelente de insectos diferentes.
Cerca das dez horas a cara dele melhorara um pouco, e com uns óculos escuros, seguiram no carro pela Picada dos Hipopótamos. Fernando contara as picadas de mosquitos e eram vinte e quatro. esperava que os dois comprimidos de quinino fossem suficientes para o proteger....
Pararam junto do rio Suthu, a observarem as águas azuis e calmas, onde nada se movia, excepto um tronco. O tronco desapareceu, provando ser um crocodilo. O dia estava muito quente e húmido, e ele sentia uma espécie de febre, pensou " porque voltara ele para ela ? estava louco ? " .
Com uma calças cor de rosa e blusa branca, demasiado justas, ela observava a planície, através dos binóculos. Exclamou excitada que vira uma família de macacos e começou a abrir a porta do carro. Fernando encolheu os ombros, em duas horas de viagem pela reserva, não tinham visto um único leão ou elefante " Se aparecer um guarda tu é que falas com ele ! " gritou-lhe. Ela riu-se e afastou-se um pouco do carro. Começou a chamar os macacos, que fugiam dela. Ele com a máquina fotográfica, procurou animais para fotografar. Entre as ervas, que chegavam acima dos joelhos , viu de súbito duas chitas, deitadas ao sol da tarde. saciadas, satisfeitas, mas de olhos abertos. a menos de ...cem metros ? Pensou naquele documentário que vira, sobre a velocidade que as chitas atingiam em corrida. Devia chamar Teresa. Mas não chamou. Pensou em como Margarida gostava de gatos, como gostaria de estar ali. Teresa entrou no carro. Ele não lhe disse nada sobre as chitas que vira.
Cerca das cinco horas, ela quis sair de novo do carro. Dentro de uma hora anoiteceria, tinham de estar de volta ao campo. Surgiu um carro de turistas, com uns sul africanos que tinham estado na mesa a jantar junto deles, no dia anterior . O carro parou e o homem forte e loiro, debruçou-se da janela e gritou " a senhora não devia estar fora do carro ! ". Teresa fez um ar de colegial e respondeu " promete não contar a ninguém ? ". O homem deu um resmungo de impaciência e disse a Fernando " se querem ver leões, nesta estrada de onde vimos estavam alguns ". Arrancaram em direção a Thaba.
"Vamos lá ver ? " disse Teresa ? " Já é tarde, " respondeu Fernando, mas afinal decidiu ir .
Lá estavam eles, uma leoa com as suas crias, sossegada à sombra. Pararam a alguma distancia, e Teresa, claro, quis sair do carro para tirar algumas fotos. Ele encolheu os ombros de novo. Ela afastou-se mais um pouco. A leoa levantou-se e devagar, começou a afastar-se com as suas crias.
Tinham menos de uma hora para voltar para Thaba. Ele pensou o que aconteceria se não chegassem a tempo, deixar-nos-iam na selva, toda a noite ? E se ele simplesmente partisse e a deixasse ali ? Ligou o carro e começou lentamentente a fazer marcha atrás, para dar a volta. Ela parou, olhando para ele, sem falar. Ele engatou a primeira. preparava-se para arrancar quando viu o carro dos guardas, a aproximar-se. " Têm de voltar para o acampamento ! " , " estão a 30 km e falta meia hora para fecharem as portas ! ". disseram eles.
Teresa entrou no carro e olhou pela janela. Engoliu as lágrimas. Não só já não gostava dela , como a queria morta.
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